15 de novembro de 2012

Consolação


Se não fosse eu mesma
parada na plataforma do trem
Olhar-me-ia com olhos curiosos
de quem não entende um
Rosto tão ingênuo carregado
de não dizeres.

Se pudesse, me provocaria
com olhares subalternos,
Piscadas de meia noite
que relutam em expressar compaixão.

Se fosse as horas datilografadas
no relógio da estação,
Eu não hesitaria em perguntar
pela minha dúvida melancólica,
Pelo meu desejo em caminhar na garoa
e, mesmo assim, sentir o céu
Anil de crepúsculo
que retrocede em plena felicidade.




NathalyaG  -  15/11/2012 – 20:34

31 de agosto de 2012

noite da lua


o moreno meio branquinho
sentou-se no banquinho
e com a sua melodia
pôs-se a cantar para a rua


e se a rua fosse feita de lua
certamente os lábios de sua
menina trovaria uma rima
sem tino nem tinta.


abotoou um sorriso em seu chapéu
rodopiou um sereno entoar
cantou na noite crua
enquanto a lua escurecia no céu


e sua menina agarrou o seu pescoço
mostrou seu bronzeado
numa deixa caída de seu ombro
fazendo o raiar da madrugada surgir em seu sorriso.




NathalyaG – 30/08/2012 – 21:56


28 de agosto de 2012

do alto do mundo



da janela de onde não sinto o frio,
a noite esconde o rato envenenado,
a moeda perdida no bueiro,
a serpente de conversas na calçada.
do alto do céu qualquer repente é evidente,
qualquer tristeza é simplificada
e o amor é tudo aquilo que passa.


desse alpendre de cinza existir,
eu finjo em ver nuvens que escoam um sol dourado,
a moça pálida que sorri ao caminhar,
a borboleta transparente de luz.
do alto do mundo
nenhum pássaro solitário será percebido,
a água cairá sem que seja tempestade
e tudo aquilo será, apenas, um somente.



NathalyaG – 27/08/2012 – 19:45


18 de julho de 2012

Tristão e Isolda


Meus amores são aqueles de voz bonita,
cabelos enrolados
e sorriso fácil.


Meus amores, que considero amores,
não combinam com meus pensamentos ao meio fio da madrugada,
não é tinta de minhas palavras.


Meus amores são três flores num único solitário,
recorte de estampa feito saia minha,
carinho no rosto sem moldura.


Meus amores são festa em hora sem mim,
abraço na oportuna esquina escondida,
beijo de escuridão lívida.


Meus amores são boca calada em discursos,
tropeço em rua esburacada,
rima sem tom.


Esses meus amores são olhares de esguelha,
toques interditados pelo dizer da razão,
palavras em silêncio de poesia minha.




NathalyaG – 04/07/2012 – 22:17

14 de julho de 2012

O gavião


O gavião andou pelos ares com suas asas abertas feito duas tábuas negras. 

Voou pelo vento forte do meio dia e, como num suspiro calmo, parecia ser feito de nuvem.

Não tinha peso nem corpo, seus nervos e músculos, assim como suas garras e bico, pareciam feitos a levitar. Como num sussurro que a terra dá antes de uma tempestade, aquele gavião deixou-se cair na maré dos ventos.

Esticou seus membros, levantou sua cabeça e plainou conforme o redemoinho dos céus, dançou feito folha de papel, sem matéria nem dor.

E como numa chuva de verão, riscou o céu com sua cor, brandiu no ar seu canto e foi ao longe, erguido como uma vela dum navio, perder-se no horizonte da imensidão até virar um nada como o azul e o branco daquele universo.

Voou sozinho feito folha seca, pingo caído e oração rogada.

Lá com ele, fui eu.





NathalyaG – 12/07/2012 – 13:12 – Franca - SP

27 de junho de 2012

Rio de Janeiro



À Eleusa Garcia


O que há no ar que cheira a mar?
O que há nas gaivotas que plainam sobre o lago?
O que há com o horizonte enviesado de montes?
O que há com as favelas no meio da cidade?
O que há com o som do vento que parece inexistente?
O que há com os guardas que bebem uma água fresca?
O que há com a moça que lê um livro deitada na mureta?
O que há com a areia que caminha lenta entre os vãos da calçada?
O que há com o molejo dos passos de pés descalços?
O que há com os apitos que coordenam o trânsito?
O que há com a neblina que embala o Cristo pelas manhãs?
O que há com a experiência não vivida?
O que há com a lembrança que nunca existiu?
O que há?





NathalyaG – Aterro do Flamengo, RJ – 22/06/2012 – 15:56

20 de junho de 2012

Naquela quase chuva de fim de tarde


Fui tomada tão inconseqüentemente pela melodia de Caetano,
aquele Caetano tão bem vindo em dias de céu cinza
que caía na tarde de São Paulo.


Movi-me juntamente ao teu sotaque
e parei calada,
sorrindo,
boba.


Não sei o que pensava ou sentia,
fora como um silêncio embriagado que tomou-me
muito de repente,
muito de um jeito afora sem jeito,
dum trejeito quieto que me ouvia.


Ouviu o que nunca disse com
 palavras minhas,
disse com palavras suas
aquilo que Caetano teimava em cantar.


Cantava bonito demais.
Cantou tudo de mim. 




NathalyaG – 20/06/2012 – 17:20

14 de junho de 2012

Empassárados


Vieram de um silêncio negro,
Trouxeram uma estranheza no ar,
Levaram embora o calado,
Tiraram o nada do lugar.


Eram pássaros cantando a noite,
Pássaros noturnos,
Um tanto passageiros.


Disseram uns que ouviram rapidamente,
Outros ouviram quietos e medrosos,
Outros vários dormiam em nuvens.


Eu ouvi de olhos fechados.


Foram pássaros noturnos passando ao céu,
Entrando numa noite que era quase madrugada,
Na neblina da quase noite anoitada.


Cantaram como num dia que chega,
Mas que já era longa sua ida,
Demorada a sua chegada.


Noite que caiu.


Mas são pássaros que cantam,
Pássaros invisíveis como o breu.


Podem pássaros não cantar?




NathalyaG – 14/06/2012 – 00:33

12 de junho de 2012

Um viver


Não haveria poesia se os tormentos da madrugada
Não me afligisse,
Não existiria soneto perfeito se música intocável da alma
Não fosse tocada,
Não teria de aparecer um verso calado se toda a voz de mim
Não fosse dita.


Não poderia recitar estrofes do sofrer de amar
Se todas as flores do silêncio teu se sepultassem,
Não haveria morte cotidiana
Se todas as cenas do dia não fossem narradas,
Não andaria corpo meu ao vento da manhã
Se nele não pudesse ouvir o mais solene cântico da humanidade.


Se todas as poesias que escrevi
Não pudessem existir
Eu mesmo não teria forma nem cor.


Se todos os versos meus
Não pudessem exprimir-me em dor de ser-se,
Talvez a vida não se fizesse como é.



NathalyaG – 12/06/2012 – 00:30

6 de junho de 2012

Amar-te



digam que Amo à toa
como parte de um sofrimento já sepultado.

disseram que Amei muito por algo não tão justo
e que ficou como fel escorrendo pelo meu peito.


digo que Amei tendo muito Amado
uma parte minha-sua que em mim se faz,
uma parte muita em todo muito,
a parte fragmento de
Tudos.


Amei como o oculto de uma razão enganada,
como uma onda que se quebra na correspondência do já sabido,
como uma razão que gosta de ser mentida e revirada
em praia de saberes mudos.


Amo agora sem ter o corpo em carne viva,
mas viva a alma de sentir e de doer.


Amarei em todas as noites escuras e, que assim,
Liberta-se de formas de luz e claridade,
deixa na escuridão o Liberto ser sem obrigação.


Amo o que Liberta em imaginações fugidias,
em histórias recontadas, revoltas, giradas.

Vivo o Amor Amado e não Amado,
o Amor cálido,
calado de tanto falar em Amor,
que mesmo no não Amar
desabrocha-se em Flor- Amor.


viverei sem ter vivido o presente pressentido,
presenteado pelo passado nunca estatuído,
pelo futuro nunca planejado.


Vivo Amando-te,
em Amor,
Amando.




NathalyaG – 05/06/2012 – 22:53